Hoje, 80 orações.

Ele que tem — e sempre terá — meus seios fartos de leite ao seu dispôr. 
Minhas mãos prontas para o manter limpo. 
Meu colo quente para qualquer indício de lágrimas nos seus pequenos olhinhos.
Meu colo quente para qualquer momento que acharmos que o colo é o seu lugar. 
Minhas pernas prontamente de pé para quando ele quiser ser embalado. 
Minha voz pouco afinada para quando ele quiser ouvir cantar. 
Ele que eu amo como jamais as palavras explicarão.

Fiz as contas. São 80 dias. 
Oitenta dias com o melhor bebê que já vi. O mais calmo, o mais colaborativo.
Ou melhor: oitenta noites.
Para ele: Oitenta noites de carinho. 
Para mim: Oitenta noites sem descanso.

Oitenta noites que um olho se fecha, mas o outro está aberto.
Oitenta noites de constante estado de alerta. Não existe sono profundo. Não há descanso perfeito. 
Oitenta e uma noites se contar a madrugada em trabalho de parto.
Oitenta e duas noites se contar a madrugada angustiada querendo parir.
Oitenta e três noites se contar a madrugada de dores no corpo. 
Oitenta e quatro noites se contar a madrugada que a ansiedade quis resolver meus relacionamentos.
Oitenta e cinco, oitenta e seis, outras oitentas, noventas, cem noites na regressão temporal.
Para cada noite que passei gestando, cada noite que passo amamentando, cada sono interrompido para verificar o bebê, a cada troca de fralda noturna, a cada momento que finalmente poderia estar dormindo mas abraço a insônia, para cada vez que percebo minha exaustão, se faz no meu coração uma oração. 
Um rezo para que eu possa ser recarregada de carinho, de segurança, de auto-amor. Um rezo pela reorganização emocional. Um rezo para o Tempo: para que Ele me ensine a respeitá-lo. 
Rezo para que eu possa compreender os sentimentos que só têm se expressado sinceramente em lágrimas, pois as palavras são limitadas. Rezo pelas minhas relações, para que eu saiba distinguir o que são minhas obrigações, quais são os meus deveres e como estabelecer limites. Rezo para que eu possa encontrar lugares e pessoas que me recarreguem de força, que me ofereçam amor, abraços, palavras. Rezo para que eu aprenda a receber tudo que vier de um coração pronto para amar. Rezo para que eu saiba perceber de onde a cura vai chegar dessa vez. E, caso eu não saiba, eu rezo para que ela chegue mesmo assim.

Nessa octagésima noite, eu rezo para que eu reze mais.